quinta-feira, 23 de agosto de 2012

ISSO É NOTÍCIA OU DISCURSO RELIGIOSO?



O exemplo abaixo foi tirado de um “blog” que defende o chamado “criacionismo científico”, proponho que o analisemos segundo os critérios apresentados nas páginas anteriores, sobre as estratégias dos discursos religiosos:
“MEC diz que criacionismo não é tema para aula de ciência”. Este é o título da matéria feita pelo Jornal Folha de São Paulo, do dia 13/12/2008, onde a secretária da Educação Básica do Ministério da Educação, Maria do Pilar, mostra a opinião do MEC sobre o assunto, informando que não considera a teoria do Criacionismo Científico uma ciência, tendo como base a opinião da maioria dos cientistas na área. Leia sua declaração: "[O ensino do criacionismo como ciência] é uma posição que consideramos incoerente com o ambiente de uma escola em que se busca o conhecimento científico e se incentiva a pesquisa".
Opinião divergente tem o grupo Pueri Domus Escolas Associadas, uma rede laica que reúne 160 escolas no Brasil inteiro, que apoia a exposição da teoria criacionista nas salas de aula, e sobre o assunto vale o comentário do Lilio Alonso Paoliel-lo Júnior, diretor de conteúdo da rede associada, informando que o ensino das duas teorias é um benefício para promover o debate: "Negativo seria não deixar que a discussão acontecesse. É uma questão de posição pedagógica. O conteúdo é aceito por pais das escolas laicas e das religiosas", diz o diretor.
Como dissemos, essa suposta notícia está postada num blog de opinião declarada a favor do criacionismo (teoria baseada na leitura literal de relatos míticos da Bíblia que contam como Deus criou o mundo, teoria religiosa que vê do darwinismo evolucionista seu grande rival). Saber qual a posição do enunciador já nos ajuda a identificar os caminhos da argumentação. Notemos que o texto segue os critérios jornalísticos, parece imparcial, narrado em terceira pessoa, e o narrador nunca expõe sua opinião diretamente.
Aqueles recursos que criam a sensação de imparcialidade, objetividade, cientificidade, estão todos presentes. Vemos toda a atenção dada aos nomes das pessoas, à data e fonte da publicação, às instituições envolvidas. Temos também as citações, e a primeira, que está de acordo com a posição do MEC e com “cientistas da área”, e da secretária da educação. Nesse caso a citação é completamente desnecessária; as palavras de Maria do Pilar não dizem nada que já não tenhamos compreendido a partir do texto anterior. Temos aí um recurso de ancoragem do texto com a realidade, e como leitores, sentimos que estamos sabendo das coisas como realmente aconteceram.
Mas o narrador quer ir adiante, quer demonstrar que há um problema na decisão dos primeiros, então usa outra instituição, o colégio Pueri Domus que é uma instituição de ensino voltado para crianças cujas famílias possuem alto padrão econômico. É interessante notar que, embora essa instituição não tenha a mesma “autoridade” que o MEC nem o conhecimento específico dos “cientistas da área”, o narrador quer exaltar suas virtudes para fazer de sua opinião algo convincente. Então ele usa a designação “laica”, para dizer que eles não são cristãos fanáticos defendendo uma causa religiosa (acusação certamente recorrente contra os defensores dessa opinião), e diz que o Pueri Domus conta com 160 escolas no Brasil, um recurso quantitativo que procura dar importância à instituição. Só então vemos a segunda citação, desta vez, de um representante do Pueri Domus que apoia o ensino do criacionismo nas escolas de nível fundamental.
O diretor do colégio diz que seria negativo não deixar que a discussão ocorresse, ou seja, não permitir que se ensinasse o criacionismo ao menos junto com outras teorias supostamente mais científicas. O argumento é de caráter científico, evoca a liberdade de expressão e o direito que temos à informação, a liberdade de escolha. Todavia, ignora que a questão é outra; o problema é que a escola é, na primeira opinião, lugar para se discutir temas científicos, e o criacionismo, por não ser considerado científico por aqueles, não deve ser discutido na escola. Claro que o direito a se discutir o tema é dado a todo cidadão, mas noutro ambiente, quiçá, na igreja. Mas não é isso o que o texto quer nos dizer; lendo-o, temos a impressão de que o MEC está infligindo os nossos direitos, que há uma espécie de “perseguição” ou de preconceito contra o criacionismo. Todavia, o que está em pauta é a cientificidade do criacionismo, que parece ser questão resolvida para o enunciador, e que por isso apresenta a notícia tentando defender sua causa diante de um público religioso e de pretensões racionais.

Fonte: http://criacionismocientifico.blogspot.com.br/2008/12/saiu-na-folha-mec-diz-que-criacionismo.html

2 comentários:

Anônimo disse...

Anderson Lima, mestre, vejo com muita cautela esse assunto, pois entendo estado laico como um estado neutro, ou seja, um estado sem a influência da Religião, mas que não pode em circunstância alguma tomar uma posição sobre esta ou aquela linha científica.
O criacionismo não deve e não pode ser descartado como uma possibilidade, pois existem dados favoráveis em nível científico e filosófico a respeito. Como o Design Inteligente e a Complexidade Irredutível (http://www.youtube.com/watch?v=qQ6b1h6mWjg&feature=related) e as manifestações matemáticas na própria natureza (http://www.youtube.com/watch?=Lodj5UJNC1Y), ou o Bóson de Higgs, O Big-Bang que definiu a finitude do Universo estabelecendo com isso um Criador desse Universo, ou O motor do flagelo bacteriano (http://www.youtube.com/watch?v=cSA17otGUnw&feature=related). Mais de 500 cientístas assinaram um manifesto sobre suas reais dúvidas sobre o Darwinismo. E assim por diante. O problema está no quê os homens querem crer.
São milhares de evidências em favor do Criacionismo. Então, a pergunta é: "Porque insistem em desprezar as evidências do Criacionismo?" O quê há por trás disso? Mantenho minha mente aberta para receber informações que realmente sejam palpáveis e não só especulativas.

Anderson de Oliveira Lima disse...

Oi Ademir!

Nesse caso, eu não quis expressar opinião. O objetivo é só mostrar como o discurso está construído. Quis mostrar como a suposta notícia é totalmente parcial, mas usa recursos da língua para disfarçar isso.

Mas obviamente tenho minhas opiniões. O darwinismo é uma teoria muito antiga, incrível no seu tempo. Hoje, certamente ela passou por muitas mudanças, e falar mal de Darwin é como falar mal de Lutero. Ambos são nomes importantes na história, mas não devemos mais levar a sério nada do que disseram. As coisas mudaram.

Mesmo assim, eu me manteria favorável ao parecer do MEC. O próprio nome criacionismo é religioso, e isso invalida-o como hipótese científica. Primeiro teríamos que provar a existência de Deus, o que não é possível. Seria melhor fazer uma leitura religiosa do Big Bang e da teoria evolucionista do que tentar negá-la.